“Há uma mulher em mim que não é a mesma.”
Antônia Boscon
Estamos preparadas para a realidade de nos tornarmos menopausídicas e maturescentes?
Diante do avanço da medicina, o controle das doenças transmissíveis, o diagnóstico precoce e mudanças nos hábitos alimentares, a expectativa de vida elevou-se consideravelmente. Nós, mulheres, estamos vivendo mais! Podemos viver cerca de um terço ou metade de nossa vida após a menopausa.
Até pouco tempo, devido à baixa expectativa de vida, nem todas as mulheres viviam o bastante para alcançar a menopausa. Diversos fatores contribuíam para com essa realidade, tais como a vida difícil, a escassez de recursos, a incidência de doenças e pestes, partos complicados com alto risco de morte, feminicídios.
A média de vida entre as mulheres durante o Império Romano, por exemplo, era de 25 anos de idade. Em pleno século XXI essa média ascendeu aos 80 anos. Não podemos negligenciar a importância de falarmos sobre a menopausa e resgatarmos seu aspecto sagrado, não é verdade?!
Em virtude dos preconceitos, tabus e crenças negativas que dão maior ênfase às perdas, declínio, velhice e morte, pouco se fala sobre a menopausa embora ela sempre tenha existido. Estudos e pesquisas sobre o assunto são bem recentes e datam do século XIX. Na literatura existente percebemos um enfoque maior nos sintomas e tratamentos. Todavia, pouca ênfase é dada às experiências internas, às crises de identidade e na vida pessoal pelas quais passamos nesse período.
A menopausa é um fenômeno biológico e universal. Independente do país ou da etnia todas nós vivenciaremos esta experiência, porém cada cultura tem uma visão e uma forma de lidar com a mulher que entra na menopausa. Na Índia, por exemplo, na casta Rajput, as mulheres sentem-se premiadas com a menopausa, o que faz com que a maioria delas deseje ansiosamente sua chegada e a veja com otimismo.
Na cultura ocidental, percebemos a existência de uma sociedade capitalista, consumista, ainda machista e patriarcal que valoriza a beleza, a juventude, a fertilidade e a atratividade sexual. As mulheres na menopausa são taxadas de velhas ou ultrapassadas, feias, secas, fracas.
Acolher e aprender a lidar com o corpo que envelhece, por dentro e por fora, apesar de todos os cuidados torna-se um desafio para nós. Diante de tantas cobranças (internas e externas) e imposições sociais, muitas mulheres buscam manter a atratividade sexual e a jovialidade a qualquer custo, submetendo-se a cirurgias, tratamentos e procedimentos estéticos perigosos sem atentar para os riscos existentes.
Vale tudo para driblar o medo desesperador de envelhecer e para ser bem sucedida na hercúlea batalha contra as rugas e marcas do tempo que se desenham em nosso corpo com a passagem dos anos.
“Porque são delicados os momentos de passagem.”
Selma Ciornai
Temendo julgamentos e críticas, a maioria das mulheres vivencia a perimenopausa e a menopausa na solidão e em silêncio. A falta de conhecimento e informações sobre o que está acontecendo em seus corpos e em seu mundo interno alimentam o sofrimento físico, mental e emocional, a vergonha, a solidão, o medo, o vazio, a tristeza, os sentimentos de incompreensão, inadequação e perda, tão presentes nesse período.
Há mulheres que buscam ajuda profissional, porém precisam lidar com a falta de preparo e conhecimento dos profissionais que apresentam interpretações e diagnósticos que não atendem suas necessidades e despertam ainda mais dúvidas e angústias sobre o que de fato ocorre com elas. Incompreendidas procuram um profissional atrás do outro na esperança de que alguém possa ajudá-las a lidar com as mudanças físicas e psicológicas que, muitas vezes, as perturbam intensamente e mobilizam crises na vida pessoal.
Além disso, muitas mulheres neste período avaliam sua trajetória existencial e o que não foi vivido vem à tona. Tudo o que foi reprimido ou negligenciado, lançado “embaixo do tapete” ou nos calabouços emocionais parece emergir com potência.
É chegado o momento da travessia, da passagem. É chegado o momento de maturescer e florecer. O momento de romper com tudo aquilo que já não preenche mais.
Desapegar e abrir espaço para a chegada do novo e da mulher em nós que deseja vir à luz para ser o que nunca se permitiu ser. Para a maioria das mulheres, um momento de rupturas, cura, renovação, transformação e (re)nascimento.
A mulher que resiste à passagem fica estagnada, amarga e adoecida. A mulher que acolhe a passagem maturece, se torna mais senhora de si e, mais consciente de seu corpo, abraça seus potenciais e desfruta com plenitude de sua sexualidade.
“Pronto, aconteceu comigo.
Senti os conhecidos sintomas que me catapultaram para outra fase.
Sinto a vida com mais intensidade.”
(Antônia Boscon)
Embora frequentemente tidos como sinônimos, a perimenopausa, menopausa e pós-menopausa são fenômenos bem distintos e cada uma nós os vivencia ou os vivenciará de maneira única e particular, atribuindo sentidos e significados diversos à esta experiência que afetará a maneira como cada uma lidará com a ação da natureza e do tempo em nosso corpo. Somente não vivenciarão esta experiência as mulheres que morrerem precocemente.
A perimenopausa, anteriormente conhecida como climatério, é uma fase biológica que se manifestará na vida de qualquer mulher. Seu início se dá, para a maioria das mulheres, por volta dos 40 a 45 anos e termina por volta dos 60 a 65 anos. Se caracteriza pela redução na produção e na atividade dos hormônios ovarianos, estrogênio e progesterona, o que pode desencadear o surgimento de alguns sintomas, tais como: fogachos (ondas repentinas de calor); sudorese; ondas de calor noturnas; secura vaginal; incontinência urinária; insônia; redução da libido; prurido vaginal; instabilidade na frequência do ciclo menstrual e intensidade do fluxo; mudanças no metabolismo e ganho de peso; ressecamento da pele, cabelo e unhas; osteoporose; dores nas articulações; névoa mental; enxaquecas; irritabilidade elevada; alterações de humor frequentes; sensibilidade à flor da pele; ansiedade e depressão.
Há mulheres que passam pela perimenopausa sem grandes queixas, mas cerca de 50% das mulheres relatam muito desconforto em relação aos sintomas. O que a maioria não relata são os desconfortos em relação à sensação de que está faltando alguma coisa, de se estar murchando ou morrendo.
A menopausa é caracterizada pela ocorrência da última menstruação, é quando o ciclo menstrual cessa e perdemos nossa capacidade reprodutiva. Doze meses após a última menstruação configura-se a menopausa. Há mulheres que sentem-se aliviadas por não sangrarem mais e não sofrerem com os sintomas da TPM (Tensão Pré-menstrual), porém há mulheres que nutrem a crença de que deixaram de “ser mulher” por não sangrarem e por perderem a capacidade reprodutiva. Essa crença pode afetar a autoestima e a autoimagem dessas mulheres, desencadeando angústias, quadros de ansiedade aguda e depressão.
A menopausa pode se dar de forma natural em virtude da redução dos hormônios ovarianos. Todavia também pode ocorrer precocemente, como acontece com algumas mulheres, por volta dos 30 ou 40 anos independentemente de quais sejam as causas, como: problemas relacionados à saúde, à nutrição, à presença de doenças autoimunes, questões genéticas, irregularidades dos cromossomos, tabagismos, infecções virais, estresse, entre outros.
A menopausa artificial ou induzida, se dá precocemente, porém ocasionada por um tratamento, quimioterapia, radioterapia ou remoção cirúrgica dos ovários e do útero, sem período de transição.
A Pós-menopausa é o período que se inicia após a última menstruação e encerra-se com a nossa morte. O corpo busca alcançar um novo patarmar de equilíbrio, agora sem a presença ativa dos hormônios ovarianos.
Com o fim do mêstruo, nossa jornada reprodutiva encerra-se. Todavia, inicia-se uma nova fase, produtiva, criativa, de descobertas e possibilidades, propícia para novos projetos.
“Uma mulher que hoje não sangra mais!
Ainda sou mulher, mas diferente (…) e vivo outra revolução do meu corpo de mulher”.
(Antônia Boscon)
A perimenopausa e menopausa não são doenças, embora frequentemente sejam percebidas e tratadas como tais. Algumas doenças presentes neste período estão associadas a um estilo de vida inadequado e nada tem a ver com a menopausa.
A redução dos hormônios ovarianos provoca mudanças em nosso corpo e o aparecimento de sintomas, que para algumas mulheres, são muito incômodos chegando a comprometer suas atividades diárias e a qualidade de vida. Em busca de alívio para tantos desconfortos, há mulheres que adotam o uso da TRH (Terapia de Reposição Hormonal) ou a prática das terapias complementares.
É importante, primeiramente, fazer uma avaliação médica com uma ginecologista, ponderar sobre os riscos e benefícios da TRH, esclarecer quaisquer dúvidas a fim de que sua escolha seja consciente e responsável. Não faça uso de qualquer medicamento ou hormônios sem orientação e acompanhamento médico.
É importante salientar que a TRH não cura depressão nem tão pouco previne rugas ou ganho de peso, não impede o envelhecimento e não é preventivo para os distúrbios cardiovasculares.
Outras terapias, conhecidas como complementares ou alternativas, auxiliam no alívio dos sintomas da menopausa e são recomendadas por seus benefícios terapêuticos e pelo baixo índice de efeitos colaterais.
Entre essas terapias podemos citar a Fitoterapia que propõe o uso de ervas medicinais específicas para a menopausa que apresentam efeito similar ao estrogênio no organismo, pois são ricas em fitoestrogênios, As ervas podem ser utilizadas por infusão, decocção, maceração, sucos, banhos, xaropes, cataplasmas, gargarejos, inalações.
A Homeopatia é uma terapia que se mostra eficaz para algumas mulheres e sua essência se fundamenta na compreensão e cura da mulher como um todo e não apenas dos sintomas. Contempla aspectos físicos, emocionais e mentais, ambientais, sociais, relacionais e familiares, além de padrões de adoecimento na família. Os medicamentos utilizados são de origem mineral, vegetal e animal diluídos e dinamizados em pequenas doses.
A Medicina Tradicional Chinesa, como o próprio nome diz, foi desenvolvida na China e se baseia na busca do equilíbrio entre as energias yin-yang por meio da acupuntura, da fitoterapia chinesa, dos exercícios físicos do Tai Chi e do Q gong.
As massagens terapêuticas também fazem parte das terapias complementares e proporcionam momentos de autocuidado e bem estar. Auxiliam na melhora da circulação, promovem o alongamento e relaxamento, além da estimulação dos órgãos internos. Existem vários tipos de massagem com indicações específicas.
A aromaterapia faz uso dos óleos essenciais extraídos de plantas e sua ação ajuda a equilibrar o corpo e a mente. Os florais, essência de flores e plantas, são utilizados em tratamentos complementares e sem efeitos colaterais.
Meditação, exercícios de respiração consciente e relaxamento, a prática regular de atividade física, mudança nos hábitos alimentares amenizam o desconforto provocado pelos sintomas da menopausa.
Independente de qual seja a terapia adotada, busque a ajuda de profissionais habilitados e qualificados. Evite a automedicação.
“Eu procuro por mim. Eu procuro por tudo o que é meu e que em mim se esconde”.
(Fábio de Melo)
Durante o período da perimenopausa e menopausa, vivenciamos muitas mudanças e elas não se restrigem ao biológico e físico. Nosso estado mental, emocional e psicológico também passa por mudanças e some-se a elas as muitas perdas sofridas.
A maneira como lidamos e (re)significamos essas mudanças e perdas podem gerar intenso sofrimento psíquico que se manifesta em forma de angústia elevada, oscilações de humor, anedonia, isolamento, a sensação de não saber mais quem se é, crises agudas de ansiedade acompanhadas ou não de pânico, depressão e até crises de ideação suicida.
Há mulheres que se encontravam num quadro de adoecimento mental/emocional e com a chegada da perimenopausa e menopausa esse quadro se intensificou e é necessária a ajuda profissional de um(a) psicólogo(a). Dependendo do grau de sofrimento se torna indispensável o acompanhamento com um(a) psiquiatra e o uso de medicação psicotrópica pelo tempo que for necessário. Isso faz parte de um tratamento.
À medida que nos cuidamos e nos permitimos “ser cuidadas”, vamos nos limpando e, quem sabe, nos curando de nossas dores, feridas e traumas emocionais acumulados durante nossa jornada existencial. A bagagem tão pesada vai se tornando mais leve até o momento em que percebemos que não precisamos mais carregá-la.